Impressões sobre o Sínodo (II): Ser ou não ser, eis a questão.
Existe pecado, e pecado mortal? Ser ou não ser católico de verdade – eis toda a questão!
Por Pe. Romano | FratresInUnum.com
O debate suscitado na Igreja e na mídia, a
respeito da Comunhão aos casais em segunda união, depois de um
casamento contraído validamente por um ou pelos dois “cônjuges”,
deixa de lado uma questão fundamental: existe pecado, e pecado mortal?
E, mais ainda: quem se encontra objetivamente numa situação de pecado,
pode salvar-se?
Uma das terríveis lacunas deixadas pelo
Relatório final do recém concluído Sínodo sobre a Família, em particular
nos polêmicos e ambíguos nn. 84-86, é a total ausência de referência ao
pecado no qual vivem as pessoas que se encontram em uma união adúltera.
Sim, adúltera.
Por mais que se possa apelar ao
sofrimento em que se encontram tais pessoas, e por mais graves que
tenham sido as razões que levaram à separação de um casamento anterior
válido, o fato é que essas pessoas estão vivendo numa situação de pecado
e em perigo de se perderem eternamente!
A primeira atitude da Igreja, ao acolher
essas pessoas – uma atitude de verdadeira misericórdia! – é de ajudá-las
a se confrontarem com a verdade divinamente revelada, sobre a unidade e
indissolubilidade do matrimônio, e a buscarem o único caminho possível:
o da conversão e da mudança de vida. Caminho este que poderá ser árduo e
longo, mas que não pode ficar pela metade. Seria um gravíssimo erro,
tanto para essas pessoas como para todos os demais fiéis, propor
soluções pastorais de “integração” que, inevitavelmente, levariam à
acomodação artificial a uma situação objetivamente grave, que teria
consequências fatais, isto é, em breves palavras, a condenação eterna ao
inferno.
Mas, que consciência têm nossos pastores
dessas verdades fundamentais? A perda da consciência do pecado é,
certamente, o maior drama da nossa época. E se aqueles que são chamados a
pregar o Evangelho a todas as gentes, e a anunciar que, sem conversão,
não há salvação, omitem-se em anunciar tais verdades, estamos diante de
uma situação catastrófica! De fato, o discurso atual, dentro da Igreja, e
que se refletiu sobre o Sínodo, é o de quase absoluto silêncio sobre as
verdades últimas da nossa existência – os novíssimos -: morte, juízo,
inferno e paraíso, e sobre o pecado, que condiciona a nossa salvação.
Verdades basilares da nossa Santa Religião, e que devem determinar a
nossa vida sobre esta terra, porque, como diz Nosso Senhor, “que adianta
ao homem ganhar o mundo inteiro, se vem a perder a sua alma?” (Cf. Mc
8, 36)
Estamos, portanto, no coração da crise da
Igreja, que é uma crise de fé. Fé na Redenção, cuja visão parece – ao
menos no discurso e na prática pastoral – distanciar-se sempre mais da
sua intrínseca conexão com o pecado, que é a causa de todos os males,
temporais e eternos, do homem. Cristo se torna o amigo, o companheiro de
caminhada dos homens, o defensor das causas mais nobres da humanidade, e
não o Salvador, o Redentor que vem para tirar o pecado do mundo, para
reconciliar o ser humano com Deus, livrando-o do pecado. Não é, pois, de
se admirar que a abordagem do Relatório seja toda ela de cunho
sociológico e antropológico. Palavras como integração, acolhida,
avaliação da situação concreta, quando dissociadas, ainda que
indiretamente, da verdade integral da Revelação, reduzem a mensagem
evangélica a uma mera filantropia e a uma misericórdia que quer quase
que justificar o pecado a todo custo.
Certamente, não há nada de novo no que
acabo de dizer: afinal, este é o discurso que, há muito, ecoa a partir
dos púlpitos e cátedras, e de inúmeros simpósios e congressos. Contudo,
parece que entramos numa nova fase, na qual aqueles que receberam
autoridade máxima para ensinar a verdade e dissipar as trevas do erro,
também se dobram a essa linguagem humanística e relativista. Pastores
que foram constituídos como tais para conduzir as ovelhas a Cristo
emanam um perfume sedutor de ovelhas, mas, na verdade – conscientemente
ou não -, tornam-se lobos vorazes, que abrem as portas do abismo para um
rebanho que não consegue mais distinguir o bem e o mal, se não houver
quem o ajude.
Atualíssimas, portanto, são as palavras
de Paulo VI a Jean Guiton, seu amigo e confidente, pouco tempo antes de
morrer: “Há uma grande perturbação neste momento da Igreja, e o que se
questiona é a fé. O que me perturba, quando considero o mundo católico, é
que dentro do catolicismo parece, às vezes, que pode predominar um
pensamento não católico, e pode suceder que este pensamento não católico
dentro do catolicismo se converta, amanhã, como o pensamento mais
forte. Porém, nunca representará o pensamento da Igreja. É necessário
que subsista uma pequena grei, por muito pequena que seja”. Dizeres de
um Papa que, certamente, não pode ser rotulado de tradicionalista e que,
em outro momento de grande lucidez, afirmou que “por alguma brecha a
fumaça de Satanás entrou no Templo de Deus” (29 de junho de 1972).
A Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo é,
certamente, indefectível e santa. Porém, o dano que causa às almas um
ensino vago e ambíguo não pode deixar-nos tranquilos. Por amor à
verdade, por amor à salvação eterna das almas, a começar pela nossa
própria, não podemos calar a verdade. Nas últimas décadas, tem-se falado
tanto de profetismo na Igreja, geralmente associado à denúncia das
injustiças sociais. Pois bem: é preciso nadar contra a corrente – como
os profetas!
Faz-se mister denunciar, como S. João
Batista, a maldade do pecado, da impureza, do adultério, e lembrar que
nenhuma integração forçada pode garantir a salvação eterna, se não
estiver profundamente enraizada na verdade. É necessário lembrar, também
aos Pastores da Igreja, que existe um inferno eterno, para onde todos
– incluindo eles – podem ir, se não se converterem. É fundamental que a
pregação da Igreja volte a ser “sim ou não, pois tudo o mais vem do
Maligno”(cf. Mt 5, 37).
O problema do Sínodo é, pois, uma questão de fé, da verdadeira fé, da
fé católica, sem a qual não podemos nos salvar. O dilema é este: a
perda da fé católica. Ser ou não ser católico: eis a questão, a grande e
decisiva questão!
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