14 outubro, 2015 - Fratres in Unum
Treze cardeais escrevem ao papa. Eis aqui a carta.
Mas Francisco rejeitou na íntegra todos os seus pedidos. Enquanto isso, o programa do Sínodo desapareceu do “Relatório Final”
Por Sandro Magister, 12 de outubro de 2015 | Tradução: Gercione Lima – FratresInUnum.com: Os
treze signatários possuem cargos de primeira magnitude na hierarquia da
Igreja (ler atualização abaixo). Entre eles estão, em ordem alfabética:
–
Carlo Caffara, arcebispo de Bolonha, Itália, teólogo, o primeiro
presidente do Pontifício Instituto João Paulo II para Estudos sobre
Matrimônio e Família;
– Thomas C. Collins, arcebispo de Toronto, Canadá;
– Timothy M. Dolan, arcebispo de Nova York, Estados Unidos;
– Willem J. Eijk, Arcebispo de Utrecht, Países Baixos;
– Gerhard L. Müller, ex-bispo de Regensburg, na Alemanha, a partir de 2012 prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé;
– Wilfrid Fox Napier, arcebispo de
Durban, África do Sul, o vice-presidente do sínodo já em curso como
também da reunião anterior, em outubro de 2014;
– George Pell, arcebispo emérito de Sydney, na Austrália, a partir de 2014 prefeito da secretaria do Vaticano para a economia;
– Robert Sarah, ex-arcebispo de Conakry,
Guiné, a partir de 2014 Prefeito da Congregação para o Culto Divino e a
Disciplina dos Sacramentos;
– Jorge L. Urosa Savino, Arcebispo de Caracas, Venezuela.
Na carta, concisa e clara, os treze
cardeal submetem à atenção do Papa uma série de “preocupações” deles e
de outros Padres sinodais sobre os procedimentos do Sínodo, na sua
opinião “configurado para facilitar resultados pré- determinados sobre
questões controversas importantes”, e sobretudo com relação ao
‘”Instrumentum laboris”, considerado inadequado como “o texto de
orientação e fundamentação de um documento final.”
Aqui está o texto da carta, traduzido a partir da versão original em Inglês:
Santidade,Como o Sínodo sobre a Família se inicia, e com o desejo de vê-lo produtivamente servindo à Igreja e ao seu ministério, nós respeitosamente pedimos que vossa santidade considere uma série de preocupações que temos ouvido de outros padres sinodais, e que compartilhamos.Enquanto o documento preparatório do sínodo, o “Instrumentum Laboris”, tem elementos admiráveis, tem também seções que se beneficiariam de uma substancial reflexão e reformulação. Os novos procedimentos que orientam o sínodo parecem garantir sua influência excessiva sobre as deliberações do Sínodo e sobre seu documento final. Tal como está, e dadas as preocupações manifestadas por muitos padres sobre suas várias seções problemáticas, o “Instrumentum” não pode adequadamente servir como um texto de orientação ou fundamento de um documento final.Os novos procedimentos sinodais serão vistos por alguns como carentes de abertura e genuína colegialidade. No passado, o processo de oferecer proposições e votar essas proposições serviu ao propósito valioso de adotar as medidas concebidas na mente dos padres sinodais. A ausência de proposições e discussões relacionadas e de votação parecem desencorajar o debate aberto e restringir a discussão aos pequenos grupos. Assim, nos parece urgente que a elaboração de proposições a serem votadas por todo o sínodo devam ser restauradas. A votação de um documento final sai tarde demais no processo para que se faça uma revisão completa e ajustamento sério do texto.Além disso, a falta de participação dos padres sinodais na composição da comissão de redação criou um desconforto considerável. Os membros foram indicados e nomeados, não eleitos, sem consulta. Da mesma forma, qualquer um trabalhando na elaboração de documentos no âmbito dos pequenos círculos deveria ser eleito, não nomeado.Por sua vez, esses fatos criaram uma preocupação de que os novos procedimentos não são fiéis ao espírito tradicional e ao propósito de um sínodo. Não está claro porque essas mudanças processuais são necessárias. Um número considerável de padres sente que o novo processo está destinado a facilitar resultados pré-determinados sobre importantes questões em disputa.Finalmente, e talvez o mais urgentemente, vários padres expressaram preocupação de que um sínodo projetado para tratar de um assunto pastoral vital – o reforço da dignidade do matrimônio e da família – pode tornar-se dominado pela questão teológica / doutrinária da comunhão para os divorciados civilmente recasados. Se assim for, isso vai inevitavelmente levantar ainda mais questões fundamentais sobre como a Igreja, daqui para frente, deverá interpretar e aplicar a Palavra de Deus, sua doutrina e sua disciplina às mudanças nas culturas. O colapso das igrejas protestantes liberais na era moderna, acelerada por seu abandono dos elementos-chave da fé e da prática cristã em nome da adaptação pastoral, merece muita cautela em nossas próprias discussões sinodais.Santidade, nós oferecemos estes pensamentos em um espírito de fidelidade e agradecemos por considerá-las.Fielmente em Jesus Cristo.
Na tarde daquela mesma segunda-feira, 5
de outubro, durante a primeira discussão na sala de aula, o Cardeal Pell
e outros padres sinodais retomaram alguns dos temas tratados na carta,
sem no entanto citá-la explicitamente.
Papa Francisco estava presente e ouvia. E na manhã seguinte, terça-feira, 6 de outubro tomou a palavra.
O texto desse seu discurso não programado
não tinha sido publicado, mas foi resumido verbalmente pelo padre
Federico Lombardi, e escrito no “L’Osservatore Romano” da seguinte
maneira:
“O Pontífice quis reafirmar que o Sínodo atual está em continuidade com o que foi celebrado no ano passado. Com relação ao ”Instrumentum laboris”, Francisco destacou que esse é o resultado da “Relatio Synodi” juntamente com as contribuições enviadas mais tarde, e que foram aprovadas pelo conselho pós-sinodal – que se reuniu na presença do Pontífice – e que é a base para continuar o debate e as discussões nos próximos dias. Neste contexto, essencial importância foi dada à entrada dos vários grupos linguísticos. O papa recordou também que os três documentos oficiais do sínodo do ano passado são os seus dois discursos, início e fim, e o “Relatio Synodi”. O Papa sublinhou que a doutrina católica sobre o matrimônio não foi tocada e, em seguida, advertiu para que não dêem a impressão de que a “única questão do sínodo é a da comunhão para divorciados, convidando-os a não reduzir os horizontes do Sínodo.”
Neste relato do “L’Osservatore Romano”,
Padre Lombardi acrescentou que “mesmo as decisões a respeito do método
foram compartilhadas e aprovadas pelo papa, e, portanto, não podem ser
questionadas.”
Disto resulta que Francisco rejeitou, na
íntegra, todas as exigências da carta dos cardeais, exceto a
recomendação marginal de não reduzir a discussão apenas à “comunhão para
divorciados.”
Ele rejeitou a carta, e não sem antes
jogar uma indireta polêmica, como mais tarde fez saber – através de um
tweet não desmentido – o diretor de “La Civiltà Cattolica” Antonio
Spadaro, que também estava presente na assembleia plenária, segundo o
qual o papa teria dito aos padres “para não ceder à hermenêutica de
conspiração, que é sociologicamente e espiritualmente fraca e não
ajuda.”
Tudo isso no início do sínodo. Mas, já no
fim da primeira semana de trabalho aconteceu outro caso. Mais uma vez, o
oposto dos desejos dos treze cardeais.
Sexta-feira, 9 de outubro, em conferência
de imprensa, o Cardeal Luis Antonio G. Tagle, arcebispo de Manila e
presidente delegado do Sínodo, de repente, disse que, com relação à
redação do relatório final, “aguardamos a decisão do Papa.”
E no dia seguinte o padre Lombardi disse
que “não temos certeza ainda como será a conclusão do Sínodo, se até
mesmo haverá um documento final. Vamos ver se o papa dará indicações
precisas”.
Inacreditável, mas verdadeiro. Com o
sínodo em pleno andamento, de repente, foi colocada em causa a própria
existência do “Relatório Final” que aparecia nos programas como
indicação de que todo o trabalho do Sínodo fora finalizado.
Do “Relatório Final”, de fato, havia
falado extensivamente o secretário-geral do Sínodo, o cardeal Lorenzo
Baldisseri, na apresentação oficial do mesmo, no dia 2 de outubro:
Naquele mesmo dia, Baldisseri também
havia informado que o Papa Francisco havia nomeado uma comissão de dez
cardeais e seus próprios bispos “para a elaboração do relatório final.”
Em 5 de outubro, no discurso de abertura
dos trabalhos do sínodo, Baldisseri voltou com ainda mais detalhes para
ilustrar as fases de desenvolvimento e aprovação da “Relatio”
E mais uma vez ele tinha falado em plenária, na manhã de 06 de outubro, pouco antes que o próprio Papa tomasse a palavra.
Para não falar do calendário oficial dos
trabalhos do Sínodo, que ainda dá um total de quatro dias, de 21 a 24 de
outubro, à redação do “Relatório Final”, para sua apresentação em sala
de aula, discussão e apresentação dos artigos, revisão do mesmo, e sua
reapresentação em plenária e votação final:
Na carta ao Papa Francisco, os treze
cardeais esperavam que fosse retomado o procedimento dos sínodos
passados, os quais terminavam com a votação, de uma por uma das
“proposições” a serem apresentadas ao Papa. Ou, pelo menos, na ausência
dessas proposições, se votasse ponto por ponto de um “Relatório Final”,
escrito por um conselho eleito, não pelos nomeados a partir de cima.
Mas mesmo que a “Relatio” – como ficou
claro – não exista mais, o único produto do Sínodo não será outra coisa
senão uma reformulação do “Instrumentum laboris” que os treze
signatários da carta consideram como inapto para servir como fundamento
de um documento final, por causa de “suas várias partes problemáticas”,
ou seja, por causa da incerteza de fidelidade à Doutrina.
Porque, é verdade, os 270 padres sinodais
estão trabalhando dia após dia apenas para reelaborar de cima para
baixo o “Instrumentum”. Mas, é igualmente verdade que a correção do
texto será prerrogativa de toda uma comissão nomeada diretamente pelo
Papa Francisco, nas quais os membros inovadores são maioria esmagadora,
contrários a tudo que é decidido na plenária dos Bispos. E em um texto
quilométrico e discursivo, como o “Instrumentum” – não telégrafico como
as “proposições” de muitos sínodos do passado – é muito mais fácil de
acontecer de novo tudo o que aconteceu no sínodo de 2014, com a
introdução de fórmulas vagas e polivalentes, difícil de serem aprovadas
ou rejeitadas nas plenárias com um voto seco.
“A doutrina católica sobre o matrimônio
não foi tocada”, assegurou o Papa Francisco, referindo-se a todo o
percurso do Sínodo de 2014 até hoje, em resposta às “preocupações” dos
treze cardeais da carta.
Mas o cardeal Tagle, expoente de peso
entre os inovadores, também disse na conferência de imprensa de 9 de
Outubro, com visível satisfação:
“O novo método adotado pelo sínodo
provavelmente gerou um pouco ‘de confusão, mas não há problema em ser
confuso de vez em quando. Se as coisas são sempre claras, não seria a
vida real.”
* * *
Nota do Fratres: À matéria acima, de segunda-feira, Magister fez um adendo hoje,
confirmando o conteúdo da carta, embora reconheça a possibilidade de
variações secundárias que não afetam a substância do texto. Também
atualiza o nome dos cardeais signatários, segundo divulgado pela revista
América, dos jesuítas nos EUA:
– Carlo Caffarra, arcivescovo di Bologna, Italia, teologo, già primo presidente del Pontificio istituto Giovanni Paolo II per studi su matrimonio e famiglia;
– Thomas C. Collins, arcivescovo di Toronto, Canada;
– Daniel N. Di Nardo, arcivescovo di Galveston-Houston e vicepresidente della conferenza episcopale degli Stati Uniti;
– Timothy M. Dolan, arcivescovo di New York, Stati Uniti;
– Willem J. Eijk, arcivescovo di Utrecht, Olanda;
– Gerhard L. Müller, già vescovo di Ratisbona, Germania, dal 2012 prefetto della congregazione per la dottrina della fede;
– Wilfrid Fox Napier, arcivescovo di Durban, Sudafrica, presidente delegato del sinodo in corso come già della precedente sessione dell’ottobre 2014;
– John Njue, arcivescovo di Nairobi, Kenya;
– George Pell, arcivescovo emerito di Sydney, Australia, dal 2014 prefetto in Vaticano della segreteria per l’economia;
– Robert Sarah, già arcivescovo di Konakry, Guinea, dal 2014 prefetto della congregazione per il culto divino e la disciplina dei sacramenti;
– Jorge L. Urosa Savino, arcivescovo di Caracas, Venezuela.
Papa Francisco hoje, por sua vez, pediu
perdão por escândalos ocorridos no Vaticano, sem mencionar exatamente a
que se referia. A mídia secular entendeu como uma indireta e fala em conspiração de conservadores para minar sínodo reformista, comparando o vazamento aos Vatileaks (!).
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